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Maranhense vence o racismo por meio da escrita

Vencer as barreiras impostas pelo racismo não é fácil. Tanto pela falta de representatividade, quanto pelo preconceito e pelas crenças limitantes, que tornam muito difícil para a população negra conquistar seus espaços de direito na sociedade. A escrita, o estudo e as artes são grandes aliados na hora de quebrar essas correntes, como mostra a trajetória de Luanda Martins Campos. Ela lançou sua obra pela UICLAP, plataforma democrática de publicação e venda de livros, e utilizou suas vivências pessoais como inspiração para escrever.

Betinho Saad, CEO da UICLAP, afirma que o objetivo da plataforma é ser um espaço democrático, que permita que todos conquistem o sonho de ser escritores e terem suas obras publicadas: “O mercado editorial tradicional possui uma série de amarras que muitas vezes impedem que as pessoas tenham voz. Na UICLAP, isso não acontece. Abrimos espaço para que grupos até então marginalizados possam se expressar, contar suas histórias. Ver escritoras negras talentosas brilhando nos enche de satisfação. E não são só elas. Temos muitas histórias de superação e conquista por meio da publicação de livros”.

Luanda é pedagoga, professora da educação básica em São Luís, Maranhão, além de militante do Movimento negro e contadora de histórias pretas. Mestra em Gestão de ensino da educação básica, realiza formações sobre a Educação das relações étnico-raciais e História e cultura africana e afrobrasileira na infância. Como pesquisadora, já havia publicado artigos e capítulos de livros, mas, ao terminar o mestrado, decidiu dar uma pausa na escrita acadêmica e investir na escrita popular usando a linguagem infantil. Assim nasceu sua obra “Na casa da vó Bá”, publicada pela UICLAP.

Filha de uma professora e um marceneiro, passou a infância na casa da avó quilombola. Decidiu resgatar em um livro suas memórias das tradições orais africanas, transmitidas em uma casa grande com quintal, bichos, plantas e muro baixo. “Fui criada pela minha avó enquanto minha mãe trabalhava durante o dia. A história dela faz parte da de muitos quilombolas que vieram da baixada maranhense para a capital e fundaram bairros periféricos no centro, como o que hoje é titulado território quilombola da Liberdade. Boa parte da família ficou nesse território e a casa de minha avó era em um outro bairro próximo, o bairro de Fátima. Foi lá que cresci, eu, meus irmãos e meus primos e também pessoas que precisavam vir para a capital e ficavam alojados em sua casa. Ela cuidava das crianças menores enquanto os pais iam para a roça”, conta a pesquisadora e escritora.

Quando foi para a faculdade de Pedagogia, decidiu que deveria estudar a educação ancestral baseada na oralidade africana. Abordou este tema em sua monografia e depois em seu mestrado. Luanda acredita que tem a oportunidade de divulgar esta cultura: “Ao decidir por esse tema, minha vó disse que essa era nossa obrigação, devido à escravidão e a marginalização da nossa cultura. Nós que tivemos acesso à educação teríamos o direito de contar a nossa história. Ela faleceu antes da minha formatura da graduação e por isso, tudo que escrevo leva o nome dela direta ou indiretamente. Entrei no movimento negro no ano de 2004 por conta da pesquisa e permaneço até hoje, tendo a educação como instrumento de luta”. Além de todo esse estudo e militância, Luanda confecciona bonecas negras de forma artesanal, conquistando principalmente mulheres negras que usam as bonecas para reconstruir sua própria infância.

O livro “Na casa da vó Bá” atinge pessoas de todas as idades, tendo conquistado inclusive o espaço acadêmico das universidades. Afinal, a construção da identidade negra deve começar na infância, mas não deve ficar restrita a essa fase. “A literatura negra é literatura de resistência, escrita por pessoas negras e com enredos que superam as generalizações e estereótipos de África e africanidades. Vence barreiras porque está sendo consumida nas escolas e por famílias negras e não negras”, afirma Luanda.

Luanda defende que os negros devem estudar sobre a sua ancestralidade e fortalecer as lutas coletivas do movimento negro por educação, saúde e território. A luta contra o racismo é de toda a sociedade e a escrita é uma grande ferramenta nesta missão. “Digo que devemos escrever sobre quem nós somos e usar nossa escrita para contribuir com a construção de uma sociedade equitativa que respeite as diferenças e dê voz a quem por muito tempo ficou marginalizado na história”, pontua a autora, que segue escrevendo seu segundo livro infantil, que também será publicado pela UICLAP.

Sobre a UICLAP

A UICLAP é uma plataforma democrática de publicação e venda de livros físicos, que liga o escritor ao mercado, um novo modelo de editora sem custos. Fundada em 2019 por Betinho Saad e Rui Kuroki, possui 12 mil escritores cadastrados e mais de 26 mil livros publicados.