Fredie Didier Júnior resgata história dos precedentes obrigatórios na Justiça

O advogado processualista e professor Fredie Didier Júnior, pós-doutor pela Universidade de Lisboa, foi entrevistado pelo juiz David Guimarães Meneses, integrante do Centro de Inteligência da Justiça Estadual do Maranhão (CIJEMA), na série de entrevistas gravadas em vídeo, produzida pelo Núcleo de Gerenciamento de Precedentes e de Ações Coletivas do Poder Judiciário (NUGEPNAC), divulgado nesta segunda-feira (17).

Durante a entrevista, o professor fez uma análise do surgimento e evolução do sistema brasileiro de precedentes obrigatórios na Justiça brasileira, desde o período colonial, passando pelo Império e República, aos dias atuais. “O sistema de precedentes vem sendo construído há 150 anos”, disse.

Partindo do pressuposto que o modelo de Direito adotado no Brasil tem “tradição híbrida” – misto de common law e civil law –, o jurista explicou que os assentos editados pelo então Supremo Tribunal de Justiça (hoje Supremo Tribunal Federal), de observância obrigatória, são equivalentes aos enunciados de súmulas que se têm atualmente. E, com a Constituição de 1891 e a República, foi introduzido no Direito brasileiro o controle difuso de constitucionalidade, que está intimamente ligado ao sistema de precedentes.

O professor lembrou que nos anos 30 havia decretos-lei que impunham a observância de precedentes obrigatórios no Brasil e, tanto a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) quanto o Código Eleitoral de 1965, mencionam os pré-julgados. Didier também lembrou que, há 60 anos, o Supremo Tribunal Federal adotou as súmulas vinculantes, que sujeitam os tribunais a sua obediência.

“De lá pra cá, consolidamos uniformização de jurisprudência no Código de 73 (antigo CPC), súmula vinculante na Emenda 45, repercussão geral e recursos repetitivos. O sistema de precedentes obrigatórios brasileiros, na verdade, vem sendo construído há 150 anos. É resultado de uma evolução que desembocou no Código de Processo Civil, que construiu um sistema brasileiro de precedentes obrigatórios”, enfatizou.

INDEPENDÊNCIA DO MAGISTRADO

Na visão do professor, ao contrário do que se diz, a adoção do sistema de precedentes obrigatórios não engessa a atividade judicante, tampouco afeta a independência do magistrado. Ao contrário, torna o Direito “mais flexível”. Para ele, os juízes são independentes e detêm a valoração dos fatos e as peculiaridades dos casos, mas, uma vez definida a questão de Direito, nos precedentes, não há justificativa para se opor.

“O juiz decide conforme o Direito e os precedentes obrigatórios compõem o Direito. É preciso entender que o precedente é norma jurídica. Se o juiz está vinculado ao Direito, está vinculado às normas jurídicas precedentes, que são normas do Direito, por que o juiz não vai seguir uma norma que é de observação obrigatória? O que o juiz pode fazer é distinguir e ajudar na superação”, declarou. 

Questionado se a aplicação sistemática de precedentes vinculantes pode contribuir para reduzir o uso predatório do Poder Judiciário e a litigância de má-fé, o professor ressaltou não haver dúvidas de que, diante da segurança jurídica proporcionada, o uso dos tribunais tende a diminuir, porque haverá o entendimento de que os precedentes vão prevalecer nas decisões.

“Sendo eu réu, eu vou cumprir, vou agir de acordo com o precedente, para não ser demandado, o que tem um custo a mais que o processo causa, que é o custo da sucumbência. Sendo eu o titular do direito, eu não vou demandar, tentando acertar algo, tentando obter uma decisão extravagante, fora dos precedentes”, concluiu.

CURRÍCULO 

Fredie Didier Júnior é professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia e da Pontifícia Universidad Católica del Perú; professor-colaborador do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Católica de Pernambuco; membro da Associação Internacional de Direito Processual (IAPL), do Instituto Iberoamericano de Direito Processual, do Instituto Brasileiro de Direito Processual, da Associação Norte e Nordeste de Professores de Processo e da Associação Brasileira de Direito Processual. Mestre (UFBA). É doutor pela PUC/SP  e pós-doutor pela Universidade de Lisboa, com dezenas de livros publicados.