Autoridades do sistema de Justiça e representantes do Legislativo, Executivo e de movimentos sociais participaram na noite desta quarta-feira (13/8), na Fundação de Memória Republicana, em São Luís, da solenidade de abertura do II Encontro Nacional PopRuaJud, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA). Com o tema “Justiça Emancipatória e Liberdades Substantivas”, o evento segue até sexta-feira (15/8), promovendo discussões para a garantia dos direitos das pessoas em situação de rua de forma plena e igualitária. 

A mesa de abertura do evento teve a participação do coordenador do Comitê Nacional PopRuaJud, conselheiro Pablo Coutinho Barreto (CNJ); do presidente do TJMA, desembargador Froz Sobrinho; do governador do Estado, Carlos Brandão; da presidente da Assembleia Legislativa, Iracema Vale; do ministro Reynaldo Soares (STJ); da coordenadora regional do Comitê PopRuaJud/MA, desembargadora Graça Soares Amorim; do ex-presidente José Sarney e a representante do Movimento Nacional da População de Rua, Rafaelly Machado da Silva. 

O conselheiro Pablo Barreto destacou o objetivo do Poder Judiciário de dar visibilidade a um problema crônico do Brasil, que é a violação de direitos de pessoas em situação de rua, que somam mais de 345 mil pessoas segundo dados do CadÚnico, situação declarada pelo STF como estado de coisas inconstitucional em relação aos direitos fundamentais dessas pessoas.  “Precisamos todos estar juntos, cada um na sua competência, seguindo para que consigamos propiciar que as pessoas em situação de rua tenham oportunidade de se inserir novamente na sociedade, minimizar o número de pessoas que entram todos os dias em situação de rua e assegurar seus direitos básicos”, destacou.

O presidente do TJMA, desembargador Froz Sobrinho avaliou que o PopRuaJud é um dos programas de maior alcance social do sistema de Justiça, envolvendo os órgãos dos poderes legislativo, executivo, universidades e a população, uma ampla rede de solidariedade que vai além de serviços e doações. 

Ele destacou ações como o serviço permanente de atendimento a pessoas em situação de rua que será entregue pelo TJMA e Governo do Maranhão, no antigo Casino Maranhense; o ônibus PopRuaJud do TJMA, adquirido para prestar atendimentos médicos, odontológicos e serviços em parceria com diversas instituições públicas; e a inauguração de um guarda-roupa social no Fórum de São Luís, nesta sexta-feira (15/8).

“É um trabalho de visibilidade para incluir essas pessoas, o poder público deve garantir seus direitos como moradia, educação e saúde, é um tema de profunda responsabilidade nossa”, frisou.

A desembargadora Graça Amorim falou da atuação do Comitê PopRuaJud no Maranhão, com a realização de 14 mutirões e mais de sete mil atendimentos em diversas cidades com o ônibus PopRuaJud. “Nós não vamos conseguir realizar nosso mister dentro dos gabinetes, temos que sair para as ruas e sentir na pele o que sente cada um dos nossos irmãos que são menos assistidos, que lutam por dignidade e por conquistar o seu lugar na sociedade”, pontuou.

O governador Carlos Brandão destacou os serviços de restaurantes populares e o projeto Maranhão Livre da Fome, frisando a importância das parcerias entre os entes públicos e a sociedade civil para construir soluções. “É uma causa de todos os maranhenses, não apenas do governo e das pessoas em situação de rua”, frisou.

O coordenador-geral do Comitê Intersetorial da Política Nacional em situação de rua do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, Anderson Miranda, que viveu em situação de rua, frisou a importância da participação das pessoas em situação de rua nas discussões sobre políticas para esse público. “A política não pode ser construída de cima para baixo, mas sim de baixo para cima ouvindo a população”, observou.

A representante do Movimento Nacional da População de Rua, Rafaelly Machado, destacou a importância do diálogo com o Judiciário, pedindo ações do Legislativo e Executivo para alocação de recursos para políticas voltadas a pessoas em vulnerabilidade social em São Luís, com ampliação da rede de atenção e abrigos. “Somos uma parcela excluída da sociedade, ninguém vai para a rua porque quer. O que a gente na rua precisa é de um serviço público de qualidade, humanizado e que tenha expansão de trabalhadores e dignidade na oferta de serviços”, avaliou.

AULA MAGNA

O ministro Reynaldo Soares da Fonseca, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), proferiu a aula magna abordando o tema do evento, como transformar as estruturas sociais e jurídicas, de forma a superar desigualdades e exclusões. 

Reynaldo Soares destacou o evento realizado em conjunto com as pessoas em situação de rua, que precisam ser ouvidas como peça principal do movimento em rede do Sistema de Justiça e instituições do Executivo e sociedade civil. A população em situação de rua é uma expressão dolorosa da exclusão social e da desigualdade estrutural no Brasil, grupo  marcado pela extrema pobreza, fragilidade de vínculos familiares e ausência de moradia regular, que sobrevivem nas ruas e abrigos.

“Esse fenômeno é multicasual e multicausal, profundamente complexo e envolve fatores como transtornos mentais, dependência química, desemprego, migração forçada, deficiência física e histórica negligência das políticas públicas, ao mesmo tempo a ausência de acesso à documentação, assistência social e saúde reforça o ciclo de marginalização”

O ministro destacou que a realidade desse público exigiu, por parte do Judiciário, a busca por soluções pacíficas para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, conforme determina a Constituição Federal. 

Ele destacou a Resolução n. 425 do CNJ, que trouxe a reflexão sobre a vulnerabilidade das pessoas em situação de rua; a criação de um Comitê específico e ações concretas do Judiciário de atenção a essa população, seguindo diretrizes como a não estigmatização, o respeito à autonomia e a proteção da infância e buscando garantir o acesso efetivo à justiça, assegurando direitos fundamentais e combatendo a criminalização da pobreza.

“Vocês são sujeitos de direitos. Nada sem vocês e tudo com vocês para a construção da promessa constitucional de uma sociedade livre, justa, solidária e fraterna, com diz o preâmbulo da nossa Constituição”, concluiu.

ENCONTRO NACIONAL 

Nesta quinta-feira (14/8), o evento segue na Universidade Ceuma, com seis oficinas temáticas sobre os temas Cidadania, Pessoas em Situação de Rua e o Sistema Criminal, Gestão e Governança, Violência Estrutural, Moradia Adequada e Empregabilidade e Justiça Restaurativa. As propostas que foram encaminhadas previamente nortearão os debates. A partir disso, deve ser construído um Manual Orientativo para as ações do Judiciário, o Sistema de Justiça e a Rede Interinstitucional. 

Confira a programação completa

No último dia, as atividades começam às 9h no auditório Madalena Serejo, no Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA). Segundo a programação, o primeiro painel apresentará as boas práticas da política judiciária PopRuaJud. 

Em seguida, será lançado o Protocolo Mulheres em Situação de Rua e Proteção às Maternidades, construído em parceria com o programa Justiça Plural, que é fruto de uma parceria entre o CNJ e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). O documento serve de manual operacional para a magistratura, apresentando caminhos a serem seguidos em diálogo com as políticas públicas para qualificar a atenção às mulheres em situação de rua, com ênfase na proteção de seus direitos reprodutivos e de exercício à maternidade. 

Já às 11h, acontecerá o painel sobre as perspectivas de futuro da política PopRuaJud e a Justiça Climática e Sustentabilidade Social, com a participação do padre Julio Lancellotti; e da advogada e ex-conselheira do CNJ Maria Tereza Uille. 

Na parte da tarde, serão realizadas ainda uma audiência pública com os participantes, especialmente dos movimentos sociais. Em seguida, serão conhecidos os finalistas do II Prêmio PopRuaJud nas categorias Inovação na Prestação de Serviços Judiciais e Impacto Social e Transformação. Serão premiadas as três melhores práticas de cada uma delas.